domingo, 18 de novembro de 2018

A décima-sétima praga




                       











"Brejo", Leo Almeida, 2018





Havia um general na sala
O dia nem amanhecia
Coturno limpo que brilhava
Na luz do sol que já surgia

Havia um general no sótão
Outro sob o meu colchão
Aquele palitava os dentes
o outro cuspia no chão

Havia um general no quarto
Outro na lavanderia
Lustrando suas quatro estrelas
Que nos cegava e perseguia

Um general sob o chuveiro
Um outro entupindo a pia
Com restos grossos de seus pelos
Que ao barbear-se ali caíam.

Havia um general bisonho
Que assobiava na cozinha
E um outro de olhar tristonho
Nos vigiava e nos sorria

Por fora, generais a rodo
Na casa, toda essa alcateia
Uivando e celebrando em gozo
O fim possível de uma ideia

Não sabe, ó general, um sonho
Não morre sob seu coturno
Não some, mesmo que um medonho
Mundo se mostre soturno

Não míngua à noite mais escura
Não murcha ao golpe mais rasteiro
Há generais na minha rua
Há generais no mundo inteiro

Havia generais à porta
E outros gorilando ao fundo
Ouvia o som de suas botas
Em seu caminhar rotundo

Um general de dez estrelas
Olhou-me com desdém profundo
Sabia ele, inconformado,
Que dentro, em mim, havia um mundo

Um território independente
Livre de qualquer caserna
Longe de qualquer patente
E que a si próprio se governa

A história nos tem ensinado
Que a liberdade não se entrega
Sabia o general armado
Que a morte não mata uma ideia



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