terça-feira, 1 de setembro de 2020

Outro poema sobre uma notícia de jornal


 

Thaylanne voltava de uma festa no entorno do Distrito Federal

foi abordada por três homens de bem

que lhe berraram ao ouvido que sapatão tem que morrer

e começaram a espancá-la com barra de ferro, madeira e concreto

quebrando-lhe dentes, o maxilar, rachando seu crânio, macerando sua carne

e a deixaram sem sentidos, caída sobre a lama.

Thaylane tinha dezessete anos e muitos sonhos

que se findaram numa poça de sangue.


Há, sim, demônios no caminho

vestem dentes brancos

usam branco colarinho e crucifixo

vão à missa aos domingos com a Bíblia sob o sovaco

comungam e beijam os pés do senhor morto

num langor contrito e convincente

batem gentilmente em nossas costas

e nos aniversários apertam as bochechas das crianças

mostrando a cara falsa da bondade.

À noite, quando a noite é mais escura

dentro de suas consciências frias,

saem pelas ruas e mastigam todos os anjos

devoram todos os santos

destroem toda beleza.

Esses demônios dormem

em seu vizinho, em seu irmão, seu delegado

seu patrão, seu professor, seu namorado

dormem ao lado de quem está ao seu lado

e quando acordam...ah, quando acordam...

o mundo mostra-se mal e podre

e sem milagres.

 

LAF

Nenhum comentário:

Postar um comentário