terça-feira, 8 de julho de 2014

Evangelho do Lodo









À maneira de Manoel de Barros


Sinto as raízes cantando
no tom do lodo e das pedras
o cheiro doce da luz das rãs

a carne farta da terra
anoitecendo nas gias
lesmando o sonho...desacordar.

Amanhecerei orvalho
entardecerei riacho
anoitecerei no teu suor

madrugarei tempestade
vento ventando vontades
serei semente vibrando ao sol

Almas das águas dos rios
borboletando no cio
do faz-de-conta que não tem fim

e ao me perder, criar limo
brotar canção, virar bicho.
Sei do desgosto de ser capim

O desandar das lagartas
sobre o azul de fastio
tanta saudade chovendo em mim

pelas goteiras da alma
sinto encharcar-me da calma
de quem sabe que trilha seguir.

Saudade é a luz quando escuro
o deslizar nobre e seguro
das cobras d' água no pantanal

bicho sem nem canseira
eis a saudade...certeira
ei-la, tocaia no meu quintal.
  
Se sabe a cruz, sabe a chaga
de quem conduz pela espada
de quem tem justo por não crer

na paz das almas marcadas
no chão das crias aladas
no que se passa antes de chover

Vem ver a noite emprenhada
a cor da estrela abortada
na marca-gosma das lesmas.

esse evangelho do lodo
vibra na parte e no todo
num pergaminho de pedras:

Que a chuva leve o que há de pior
que o vento traga o que há de melhor
que o fogo nos purifique
que a terra enfim frutifique
o amor.



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