sábado, 16 de junho de 2018

Impressions of Calgary

















Meio dia na cidade limpa e seca
monumento de concreto em genuflexão ante a beleza
a eternidade pétrea logo ali, na linha lábio
de Deus.
A nave de cristal e aço sobrevoa as fomes
grandiosas fomes sempre saciadas em
plástico: copo e prato e talher
no Core, na Stephen, na 17ª, no Chinook, em Cross Iron
Plástico: garfo, faca e o peito da mulher
em Eau Claire, Sunnyside, na Kensington Road
Plástico: sacos, caixas, flores a recolher
em plásticos.
E o sol frio de Calgary iluminando a acidez do curry
saboreado, em silêncio circunspecto, pela indiana e seu marido afegão
O frango, preparado por mãos chinesas,
banhado em maple syrup, honey and garlic, desfila
nos pratos de plástico, enfeitado por brócolis,
a 19 dólares e 90 cents
e sofre a espetada do garfo de plástico, o corte da faca de plástico,
e o dente dourado do redneck que anseia Stampede
no verão e Flames por todo inverno.
O vento, enovelando-se na vermelha Peace Bridge,
corta as avenidas a partir do Bow
e passa pelas skyways muito limpas e aquecidas
que, suspensas sobre as ossadas de esquecidos blackfoots,
parece não perceber que o
plástico, ao fim do dia, aos milhares
aos milhões, aos bilhões, repousará em algum canto
respirando seu veneno próximo às rochosas
esperando o momento de flutuar no mar
- há muitos quilômetros de ali -
onde ficará, intacto, com a lembrança do curry
e do maple syrup,
por milhares de anos, quando talvez nem haverá Calgary
ou skyways ou Stampede
mas certamente permanecerá, latejando, uivando
a fome daqueles que nunca puderam estar ali
sob o cristal e o aço da food court
e continuaram e continuarão engasgados
como tartarugas entaladas com o plástico
que a indiana, o afegão, o chinês, o redneck jogaram no lixo
E eu me pego triste e sem apetite
a pensar que
não há possibilidade, além do sonho, de que todo o planeta
igualmente, humanamente, deliciosamente
saboreie essas texturas e riquezas
O banquete é para poucos
num mundo de limitados recursos e plástico descartável
A bocarra voraz do capital em suas tetas
sorvendo o leite do planeta à grandes goles.
Bilhões de homens e mulheres poluem o planeta
com sua esperança de homens e de mulheres descartáveis
como plásticos
incomodando o sono calmo dos que têm o que comer
com o ronco de seus estômagos na vibração dos trovões sobre Icefield Road
anunciando a nevasca
a tormenta
a violência eventual do Bow e seu irmão Elbow nos grandes degelos
e que arrasta o indiano, o afegão, o redneck, o chinês e o capital
em suas águas de esmeraldina palidez e extremo frio
no fluxo trágico da história.
O que amo em ti, eu sei, é projeção do que há de melhor em nós
a gentileza e o respeito extremos
ocultos em nós, expostos em ti.
Tua silhueta espelhada encanta e cega, ó Calgary
e apesar de toda a esperança fraturada
insistes em berrar onward, onward, onward
mas, te pergunto, pra onde?
Me diz: pra onde?






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