quarta-feira, 27 de novembro de 2013

O Desejo II

O desejo II (Dos provérbios da carne)


Fosse chama e não cheiro
evolando-se do chão sem viço
construindo arestas nas narinas
rasgando, roçando, fresta em festa
infenso a infausta sorte  
e então o sol, por sobre os sonhos,
viria à noite, intruso não oculto
sacudir os meus lençóis molhados
o visgo, o tato, o deslizar em gozo
ardendo em equinócios desconhecidos.

Ah, a aspereza da seda!


Antes, o silêncio sobre o desejo
a mudez do falo e das reentrâncias
quase uma língua de anjos
trombetas num céu de surdo-mudos
querubins enrodilhados em pecado
e lá, no fundo da tela, o azul profundo
o mais profundo dos azuis celestes
azul azul, daqueles de presépio e uniforme escolar
sustentando os raios desse sol intruso
que insiste em arder na minha pele
durante a noite, quando queimo, enquanto durmo.

Ah, a maciez dos arames farpados!





3 comentários:

  1. "a maciez dos arames farpados"
    que bela construção para retratar, magistralmente, a doçura da dor do desejo...

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